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Eles transformaram a própria casa numa incrível loja de móveis vintage

Por
Fernanda Nascimento
Em
24 abril, 2018

Imagine viver em um lugar onde tudo está à venda. Há um ano, a casa da jornalista Vivian Lobato e do designer André Visockis é o showroom da Apartamento 61, marca que criaram em 2014. Quando nasceu, a loja era uma plataforma online em que o casal vendia os móveis vintage que garimpavam pela avenida São João e em outros endereços de São Paulo. Eles deixaram o apartamento número 61, que continua emprestando o nome ao negócio, e se mudaram para uma casa modernista no Jardim Paulista desenhada pelo escultor Victor Brecheret e reformada pelo arquiteto Rino Levi. É lá onde eles expõem as peças raras e exclusivas que restauram – um par de cadeiras do designer Jorge Zalszupin pode custar 60 mil reais. Todos os móveis cuidadosamente dispostos nas salas de estar, jantar, no jardim e em todos os outros cômodos podem ser levados para casa. O único que não está à venda, por enquanto, é a cama do casal. A seguir, André e Vivian contam como transformaram um negócio de móveis vintage em uma experiência.

Fotos: Thays Bittar

A Apartamento 61 começou vendendo móveis reformados aos amigos e hoje atende um público que não poupa esforços para ter peças exclusivas. Como foi essa transformação?
André: Quando passamos a receber clientes no apartamento onde morávamos caiu a ficha que só um site não bastava. Eu tenho uma casa no interior onde guardava alguns móveis, então quando alguém queria ver uma peça eu tinha que ir buscar, tirar o pó e deixar tudo bonitinho para a pessoa ver. O contrato do apartamento estava acabando e decidimos mudar para um lugar onde a gente conseguisse morar e ter um showroom. E aí veio a ideia de alugar uma casa modernista, dos anos 50 ou 60. Encontramos um imóvel que foi residência do Victor Brecheret e reformada pelo Rino Levi na década de 1960. A casa é uma experiência única na cidade. Não só na cidade. A gente não encontrou nada exatamente igual a esse negócio em nenhum lugar do mundo.

Vivian: Depois de dois anos fazendo o site percebemos que as pessoas nos chamavam para feiras e eventos para deixar o lugar bonito. A gente ficava putos porque tínhamos que encher uma caçamba e levar poltrona, cadeira, coisas que quebram… Em compensação, começamos a perceber que os clientes que recebíamos em casa sempre acabavam comprando.

Vocês trabalhavam com outras coisas antes de empreender. De onde veio o interesse por móveis vintage?
André: Quando eu e a Vivi fomos morar juntos não tínhamos nada para decorar o apartamento. Eu saí de uma kitnet minúscula com uma cama de solteiro e uma mesa de cavalete e ela vivia com a avó. Uma amiga falou que vendiam um monte de móveis usados embaixo do Minhocão, na avenida São João. Vimos uma mesa de pé palito aqui, outra peça legal ali e acabamos pegando gosto. Foram dois anos garimpando e aprendendo um monte de coisa por conta própria. A ideia do negócio surgiu em 2013, mas levou tempo para conhecer a galera, reconhecer peças falsificadas…

Vivian: A gente começou a vender online coisas que a gente gostava. Era uma proposta legal, mas não dava para viver dela porque os produtos eram muito baratos, então não conseguíamos vender em volume suficiente para sustentar. As pessoas têm dificuldade de entender porque a gente entrou nesse mercado. Não tínhamos a intenção de ter uma galeria em casa, foi rolando.

Apartamento 61

Como é morar em uma loja? Vocês têm coragem de sentar no sofá?
Vivian: Usamos a casa normalmente. Recebemos amigos na mesa de jantar, sentamos no sofá. A gente teve sorte também, nunca sujou nada nem nos eventos que aconteceram aqui. Mas se fazemos churrasco com os amigos usamos o sofá de couro que ainda não foi restaurado.

Vocês ficam tristes quando uma peça é vendida?
Vivian: Não tem muito isso de se apegar. A maioria das peças que a gente compra está esquecida, largada, maltratada… A gente transformou aquilo, fez acontecer, está ganhando, então não preciso ficar com aquela coisa. E às vezes é tão legal vender uma peça. A gente tem um cliente da época do site que vem aqui e fica sem graça achando que é tudo muito caro. Temos opções mais acessíveis, mas também tem poltrona de 3 mil reais. Mas às vezes ele gosta de uma coisa, parcela em muitas vezes e fala: nossa, essa é a peça mais legal da minha casa. Isso é muito bom. A gente aposta muito em educar as pessoas e conquistar um novo público. Essas peças vão ser cada vez mais valorizadas, então no fim é um investimento.

Quando vocês criaram o Apartamento 61, a proposta era expor os lucros em cima de cada peça restaurada. Por que isso mudou?
André: A gente entendeu que é um modelo que cabe para outras coisas, mas as pessoas não estavam compreendendo. As peças tinham uma etiqueta que dizia nosso lucro e o preço. Em mais de uma das feiras que participamos tinha gente querendo pagar só nosso lucro. Uma vez vendemos para a minha mãe e ela não entendeu. Para implementar um sistema desses existe uma questão de educador o consumidor. Então a gente entendeu que para o nosso mercado é algo que não faz sentido algum.

Onde vocês garimpam as peças?
André: No Mercado Livre, na OLX, em ‘família vende tudo’. Temos uma poltrona que a Vivi achou no lixo. Ela estava dirigindo e viu o guarda de uma rua sentado na cadeira. Ela parou, perguntou se ele queria vender e ele falou que só estava esperando o lixeiro passar porque alguém da casa da frente tinha jogado fora. Dizem que nos anos 90 ninguém queria saber de madeira escura, então os móveis feitos de jacarandá, que é muito valioso, estavam totalmente fora de moda. Se você ia nas lojas das Casas André Luiz tinha que escolher o que ia colocar na caçamba de tantas coisas boas que eram doadas. Hoje se uma família está se desfazendo dos móveis dos avós provavelmente a neta já pesquisou na internet e sabe o valor daquilo. Ou, no mínimo, coloca na OLX e ganha algum dinheiro. Então a escassez acaba controlando esse mercado.

Apartamento 61

Expor todos os móveis em uma casa atrai os clientes?
André: Isso é o que faz a experiência ser tão legal. Porque se um arquiteto vai à uma loja e têm vinte mesas de centro, uma ao lado da outra, ele consegue olhar para uma delas e saber que vai ficar boa para o projeto. Mas o cliente final fica totalmente zonzo e sai de lá sem conseguir escolher, de tantas opções que tem. Se ele entra aqui tem só duas mesas de centro, uma em cada sala, e mais duas lá atrás. Não gostou de nenhuma? É isso. Em compensação é um lugar onde o cliente poder vir com os filhos, tem um jardim… É uma casa.

Vivian: É muito louco, tem gente que fala: eu quero essa mesa com tudo que está em cima. Essa casa ajuda muito na venda porque ela tem essa proposta mais modernista e conversa com os móveis. Deixar ambientado faz diferença porque a pessoa já visualiza na casa dela. Essa ambientação foi uma coisa que a gente aprendeu a fazer sozinhos porque não dava para chamar um decorar para reorganizar um ambiente toda vez que um móvel era vendido.

Apartamento 61

São vocês mesmos que recebem os clientes. Como é essa relação?
Vivian: Eu falo sempre a verdade. A nossa curadoria vem de coisas que a gente teria na nossa casa, mas tem coisas que são lindas e muito desconfortáveis. Então é melhor eu já falar. Se você quer colocar um sofá que é desconfortável na sala de estar, tudo bem, mas se quiser assistir televisão nele não é tão legal.

Vocês pretendem crescer mais?
André: Nesse tipo de negócio não existe escala então, entendendo isso, gostamos de ser pequenos. A gente tem mais tempo de cuidar de cada uma das peças que vão entrar no showroom. Escolher o tecido certo, o restauro. Ter uma oficina aqui dentro permite que a gente controle quanto vai ter de brilho em cada peça, quanto cada uma vai ser restaurada. É também a nossa casa.

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