Ao invés de couro, tecido de abacaxi; no lugar do plástico, a mandioca. Estas soluções existem, e fazem parte de um crescente movimento global de substituir a cadeia produtiva linear vigente por uma circular
Já pensou em tomar água num copinho feito de mandioca? Vestir um par de tênis cujo tecido tem o abacaxi como matéria-prima? E plantar uma pimenteira num vaso fabricado a partir do bagaço da cana de açúcar? Estas soluções existem, e fazem parte do crescente movimento global de substituir a cadeia produtiva linear vigente por uma circular. Ou seja: elas nasceram do desejo de encontrar uma funcionalidade ao lixo, que, após descartado, pode ser processado e transformado num novo produto. Agora, sustentável.
O tal copo de mandioca está disponível nas sedes do Google e da Uber em São Paulo, por exemplo. As empresas são algumas das clientes da carioca CBPak, a dona da tecnologia que usa a fécula da mandioca-brava na fabricação de copos, bowls e bandejas biodegradáveis. Quando descartadas, as peças levam cerca de 40 dias para se decompor, enquanto um similar de plástico pode levar até 200 anos.
Claudio Bastos começou a desenvolver a solução em 2002, quando pouca gente falava sobre consumo consciente. “Na época, minha intenção era resolver o problema do lixo no mundo. Queria desenvolver um produto bacana. Quando falava disso, todo mundo me chamava de louco”, conta o empresário, que hoje produz 1 milhão de peças por mês.
À exemplo dele, Patrícia Ponce e Natália Naime investiram anos de pesquisa no bagaço da cana para ser uma alternativa ao plástico. Com a matéria-prima — o maior resíduo da indústria agroindústria brasileira —, a dupla criou os vasos biodegradáveis da Bio & Green. Se deixados numa superfície, eles duram tanto quanto um vaso convencional. Quando plantados na terra, se degradam e viram adubo em até 45 dias.
O mundo da moda é outro que tem dado bastante atenção às soluções provenientes do lixo. A tendência se nota nas passarelas, vitrines e parcerias entre produtores de tecidos sustentáveis e grifes internacionais. Na Itália, a Ferragamo criou uma coleção a partir de um tecido feito da celulose da casca da laranja. A inovação é da empresa Orange Fiber, que encontrou, em 2017, esta maravilhosa maneira de reutilizar os resíduos gerados pela indústria cítrica siciliana.
Também protagonista desta revolução fashion, a Ananas Anam, marca da designer e pesquisadora Carmen Hijosa, detém a tecnologia de transformar folhas de abacaxi num poderoso tecido que imita o couro. Super versátil, o produto, chamado piñatex e desenvolvido nas Filipinas, pode ser usado na fabricação de sapatos, bolsas, roupas e até estofados de móveis.
Marcas ligadas à sustentabilidade já garantiram suas coleções com a invenção. A grife australiana Taikka, de bolsas, lançou uma linha feita exclusivamente com o “couro de abacaxi”. A coleção de verão 2018 da estilista holandesa Liselore Frowijn foi quase toda concebida com este material. Na Coréia, a vegana Mary’s Pineapple usou o produto em carteiras e acessórios. E, recentemente, a Hugo Boss desenvolveu uma edição limitada de sapatos fabricados com o piñatex.
Lá fora, até a fibra da maçã, resíduo descartado pela indústria de alimentos, está sendo processada para voltar à cadeia produtiva na forma de matéria-prima para roupas, sapatos e acessórios. Resistente, o tecido foi criado pela também italiana Frumat e é mais uma alternativa ao couro. Não por acaso, já têm grifes e marcas de olho nele.
Foto de abertura: As carteiras feitas de ‘tecido’ de Abacaxi da coreana Mary’s Pineapple | Crédito: Ananas Anam/divulgação