People

Julio Secchin e seu Carnaval de palavras que conquistou o Rio

Por
Fabiana Corrêa
Em
1 abril, 2020
true

Com letras sobre nudes, MD, amores partidos e vacilos no rolé, como as músicas de Julio Secchin se tornaram o hino do jovem carioca.

Julio Secchin é quase fanho. Quem diz isso é ele, não a gente. Ainda assim, está lançando seu segundo disco (ainda sem nome no momento dessa entrevista), onde sua voz e suas palavras são a atração principal. Depois de Festa de Adeus, seu primeiro trabalho, lançado em janeiro de 2019, muita coisa mudou. A faixa “Jovem” acumulou 2,5 milhões de plays no Spotify e mais 2 milhões no YouTube. Estourou. Seu refrão “eu vacilei na primeira regra do rolê/Fiquei doidão/Liguei pra você” virou onipresente: de meme a filtro do Instagram.

Até 2018, Julio, 32 anos, nascido e criado na Zona Sul carioca, era diretor de videoclipes e estava pronto para começar um novo trabalho quando resolveu mudar de percurso. “Foi no meio de um desfile do Boi Tolo que eu aproveitei para pensar na vida. O bloco é conhecido pelos longos percursos, então deu tempo de refletir sobre muita coisa”, diz. Passada a Quarta-Feira de Cinzas, ligou para o chefe e avisou que estava indo embora. No próximo clipe ele estaria na frente das câmeras. “Olhando para trás, quando eu estava filmando, parecia que tava todo mundo pulando na piscina e só eu de castigo, lá fora”, conta. 

Com a explosão de “Jovem”, a coisa mudou. Ele passou a ser ouvido dos fones mais antenados do país e a fazer shows Brasil afora. “Comecei até a ser reconhecido por aí, uma coisa que gosto muito, me aproximar das pessoas e não ficar só nos likes”, diz. Nesses palcos, sua música amadureceu. “Assumi a importância da percussão.” E, assim, no novo disco juntou as batidas eletrônicas do funk ao seu trabalho original, bem MPB, como já havia mostrado no single “Ou Você Me Come, ou Você Cai Fora”, que gravou com a cantora carioca Rebeca em 2019. 

Depois do primeiro tu-tcha-tcha-t-tu-tcha não deu mais para parar. E foi um pulo para ganhar o rótulo de indie funk – nome que ele não curte muito. “A língua portuguesa deve ter uma solução melhor e mais ele-gante. E o termo também não faz jus ao que a música é”, diz, deixando claro que a semântica não sai da sua cabeça. Influência da mãe, que foi professora de português. E prova de que mapa astral faz sentido. Diz-se que os cancerianos são os filhos mais apegados. “Câncer com câncer no ascendente / Tudo é um drama ninguém me entende.” Na letra de “Me Acorda Antes de Partir”, Julio entrega seu mapa astral e dá uma palinha de quem é: millennial nos temas, dramático no jeito de encarar o mundo, encantado com as palavras. “Não tenho tanto interesse assim em astrologia, mas acho irresistível o recurso narrativo que ela traz”, diz. E, sim, as descrições do seu signo batem com seu jeito de ser. “Tenho uma certa melancolia que me coloca em um modo de sofrência musical”, diz. E é daí que acabam saindo as melhores letras. 

Julio Secchin | Fotos: MOA

Foi nessa combinação de coração millennial com a tradição da MPB com o samba e sua versão própria de funk que Julio encontrou um jeito de ser original. “Isso não estava claro quando lancei Festa de Adeus, foi aparecendo com o tempo.” Indie funk, aliás, pode não ser o melhor termo porque o novo disco traz também outros ritmos de matriz africana como base. A faixa “Quero Ir pra Bahia com Você” repete a parceria com Rebeca e sua delicadeza, numa base de “samba abaianado”. Parece ser uma receita para virar hit deste verão. Além da conga, do agogô e do pandeiro, o cavaquinho faz a introdução em “Serasa do Amor”, em que Julio ousou dizer “novinha”. “Como branco da Zona Sul, eu não me sentia bem em falar, até porque não curto essa objetificação. 

E também porque não quero ser aquele cara que curte Kevin O Chris, mas nunca subiu o morro. Mas, agora que todo mundo usa, não vejo mais problema”, diz. O verso faz uma citação ao cantor Ritchie, autor do megasucesso “Menina Veneno”, de 1983. “Novinha veneno, o baile é pequeno demais pra nós dois.” Quando ficou pronta, Julio mostrou o resultado para o autor dos versos. “Ele curtiu.” A maneira como o cantor administra a sua carreira é tão bem cuidada quanto suas letras. Cada detalhe faz sentido, talvez por ele estar falando para a sua própria galera. “Uma mão na consciência, outra no joelhinho”, diz em “Serasa do Amor”, citando um comentário comum nas redes sociais da vida. “Já me chamaram de um cara que joga para a galera. Poxa, comecei a cantar depois dos 30. Quero transformar a música em uma profissão viável.” Parece que deu certo e, enquanto a gente falava ao celular, um fã parou para conversar com ele num bar em Belo Horizonte, onde Julio foi para tocar num festival.

O amadurecimento não foi só no palco. Falar das coisas que vêm do coração é um jeito de crescer. “Cantar foi me expor de uma maneira que eu não estava planejando. Foi bom para enfrentar meus medinhos”, diz Julio, sobre a masculinidade contemporânea que imprime nas letras e no jeito de cantar. E não por acaso suas influências são Frank Ocean e Caetano Veloso, dois artistas que apresentam um jeito novo de ser homem. “Acabei dando nomes a sentimentos que meus amigos hétero não conseguem reconhecer, abri espaço para que sintam essas coisas que a gente ainda não sabe como”, diz. Colocar sua música no mundo foi uma maneira de ter alta da terapia, uma espécie de cura. Mas ele fica feliz quando essa cura pode servir para mais gente. “A ideia da arte é mirar em você e acabar acertando nos outros.” 

abandono-pagina
No Thanks