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Longarina e o empoderamento feminino por meio da conexão com o mar

Por
Laura Cesar
Em
8 março, 2019

A história de Cristiane Brosso e Vanessa Prando Bertelli e a vontade em espalhar para outras mulheres a sensação de empoderamento, liberdade e pertencimento ao entrar no mar

É no vaivém das ondas que as surfistas Cris Brosso e Vanessa Bertelli sentem e vivem o presente intensamente. Se tornam mais confiantes. Finalizam e iniciam ciclos muitas vezes dolorosos. Como sócias, é nesse mesmo embalo que elas encontram, entre drop e tombos, a força necessária para tocar a Longarina – projeto criado há cinco anos que estimula mulheres a caírem no mar e se conectar com a sua essência por meio do surfe e de outras atividades de autoconhecimento.

E não é apenas sobre subir na prancha e pegar onda. As surf trips personalizadas oferecidas por elas – que vão de encontros rápidos pelo litoral norte de São Paulo até jornadas de uma semana por outros países – surgiram da vontade de espalhar para outras mulheres a sensação de empoderamento, liberdade e pertencimento que elas têm ao entrar no mar. Afinal, para Cris e Vanessa ser mulher é ser cíclica: “Ora calmas, ora revoltas e bagunçadas. Um oceano de possibilidades infinitas por onde às vezes nos afogamos e às vezes apenas boiamos, por vezes só mergulhamos e noutras surfamos”.

Longarina
As sócias, Cris Brosso e Vanessa Bertelli |Foto: Bruna Veloso

Mas foram anos de muito bate e volta até a dupla entender o seu propósito e conquistar um espaço pertinho da praia de Boiçucanga, onde as duas moram atualmente. Apesar do bronze, cabelos queimados pelo sol e malemolência praiana, Cris e Vanessa são paulistanas, nascidas e criadas no concreto e formadas em gestão ambiental e administração de empresas, respectivamente. Não têm referência familiar que vem do surfe e cresceram sem casa na praia. Começaram a se aventurar na prancha por influência de ex-namorados e se apaixonaram pelo esporte mesmo sentindo falta de companhias femininas na água.

Em 2011, para manter a paixão acesa longe do outside, a solução foi começar a escrever sobre esportes de prancha e sustentabilidade para um site. E foi lá, como um hobbie no mundo online, que as meninas se conheceram e começaram a compartilhar insatisfações. “Nunca nos identificamos com a forma que o surfe era retratado pela mídia, muitas vezes como um ambiente predominantemente masculino e de mulheres estereotipadas. Aí resolvemos criar a nossa plataforma de conteúdo para ter mais liberdade pra escrever como gostaríamos e compartilhar com as meninas o que vivíamos com uma prancha na água”, afirma Cris.

As coisas começaram a fluir, ainda que timidamente. Não importa a idade, barriga, celulite e estria, o conteúdo da Longarina surgiu pra contemplar a diversidade estética da mulher real e mostrar que o surfe, skate e bodyboard, é sim pra todas. E o interesse feminino pelo esporte foi tanto que a vontade da Vanessa e da Cris de proporcionar experiência além do online se concretizou nos primeiros bate voltas pra praia organizados via Facebook, em 2013. “Formamos um grupo que se encontrava depois do trabalho, surfava um pouco e voltava. Tínhamos apenas uma prancha, e uma emprestava pra outra. Era bem roots. Uma loucura”, conta Vanessa.

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Aluna no bate e volta pelo litoral norte de São Paulo |Foto: Suellen Nobrega

Mas o que as meninas não esperavam é que o projeto até então paralelo estava chamando a atenção. As viagens começaram a rolar também aos fins de semana, com casa alugada, professor de surfe, preparador físico, van e toda a logística necessária. E por algum tempo a Longarina foi sendo tocada assim: sem um tostão no bolso, apenas movida pela paixão de suas idealizadoras.

Até que em 2015 Cris engravidou e decidiu mudar para o litoral. “Foi um divisor de águas: ou eu continuava com a Longarina ou seguia como gestora ambiental, porque os dois com filho não dava. Tive depressão pós-parto e surfar era uma forma de viver o presente e não tomar remédio”. Cansada da rotina maçante de agência de publicidade, Vanessa, por sua vez, pegou o dinheiro que havia juntado e se jogou com a amiga no mesmo sonho. Na época, elas fecharam um trabalho de publicidade com marca de cosméticos Avon e perceberam que poderiam vincular algumas marcas com as experiências.

De lá pra cá, o projeto foi se aperfeiçoando. A dupla se especializou em coach, bioenergética e conheceu a Danzamedicina, método criado pela Morena Cardoso que traz a dança como ferramenta de autoconhecimento e cura (leia o post que fizemos sobre o assunto aqui). Os retiros passaram a ser o foco do negócio, sempre voltados para a aceitação do corpo, inclusão de mulheres e sororidade. “A Longarina se tornou um organismo vivo. Um mix de dança, com coach e surfe. Começamos a observar mais do ponto de vista de uma mulher com a outra, das mulheres em rede”, diz Vanessa.

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Aulas de surfe da Longarina |Foto: Bruna Veloso

Esse ano, a programação deve ser intensa, com viagens curtas, jornadas marcadas para o Peru, Bali, Costa Rica e Amazônia, além de experiências personalizadas para empresas como o Google. Também há o Clube Longarina, que já conta com 30 assinantes que ganham desconto de parceiros, participam de eventos mensais em São Paulo e pagam menos nas aulas de surfe.

Apesar de exaustas, Cris e Vanessa comemoram as mais de 4 mil mulheres impactadas pela Longarina até agora. A meta agora é organizar a casa, expandir a rede e cair mais no mar. “A gente sai de São Paulo, mas São Paulo não sai muito da gente. E o desafio é exatamente esse: como ter uma vida mais conectada com a natureza e, ao mesmo tempo, gerar bons negócios”, se questionam. Se depender do esforço da remada da dupla, o próximo swell vai ser de boas ondas.

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Meditação antes de cair na água |Foto: Suellen Nobrega
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