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Conheça a Matos Urbanos, uma loja-bike que funciona à base da honestidade

Por
Fernanda Nascimento
Em
29 junho, 2018

Essa loja itinerante estacionada no bairro dos Jardins, em SP, funciona à base da honestidade. Conheça Renato, o manobrista que deixa uma bicicleta com seus vasos de cactos e suculentas sozinha na calçada.

Quem passa pela bicicleta cheia de vasinhos de cactos e suculentas estacionada no número 1162 da rua Estados Unidos, no bairro do Jardins, em São Paulo, olha para os lados curioso. A pequena loja itinerante não tem vendedor. Uma placa avisa os preços e as instruções para o pagamento, que pode ser depositado em dinheiro numa caixinha de madeira ou debitado na máquina de cartão que fica entre as plantas. Mas o dono desse negócio está logo ali, admirando de longe seu projeto, batizado de Matos Urbanos. Ele é Renato, um cearense de 29 anos que há dois trabalha como manobrista naquele endereço, onde fica a galeria ArtEEdições e o escritório de arquitetura Gui Mattos. Há quase três meses Renato deixa os vasos que confecciona expostos na calçada, para quem quiser levar – e, se quiser, pagar. “Tem gente que acha que eu sou louco, mas não teve uma pessoa que saísse sem pagar”, diz. “Pra você ver que a honestidade existe de verdade. Imagina se uma empresa enorme fizer isso, abrir suas portas e confiar nas pessoas, pelo menos por um dia? Eu quero mostrar que as coisas podem ser diferentes”.

Renato, criador do projeto Matos Urbanos | Fotos: Fernanda Nascimento/The Summer Hunter

Duas semanas atrás, ele descia a rua Padre João Manuel com sua loja-bike itinerante quando passou na frente do Dalva e Dito, restaurante de Alex Atala. O chef estava na calçada e elogiou a bicicleta, toda estampada com gravuras típicas dos cordéis e com uma caixa de som sempre ligada. “Eu falei: você achou ela bonita? Então lê a placa aqui que você vai gostar ainda mais”. Pois Atala gostou do projeto e chamou Renato para levar a loja ao seu restaurante nos finais de semana, os dias de maior movimento. Renato foi e ficou distante, como sempre, mirando os olhares curiosos em torno das plantas deixadas ali, sozinhas. “Depois que a pessoa pega o vasinho e paga, eu vou perguntar o que ela achou e contar um pouco do conceito do projeto”, diz.

No Dia dos Namorados, quando levou a garden bike, como ele chama, à rua Oscar Freire, também no bairro do Jardins, todo mundo queria posar para uma foto. Isso acontece com frequência quando a bicicleta está parada na calçada da Rua Estados Unidos, onde fica durante a semana, enquanto Renato está trabalhando. “O legal de colocar na via pública é que ela fica acessível a qualquer pessoa. Ao dono da empresa, à faxineira, ao morador de rua”, diz. Ele começou pendurando na goiabeira na frente da fachada os vasos de concreto que enchia de cactos e suculentas – e que lembram sua infância no meio do mato, lá no Ceará. “Não tinha como cuidar daquilo e manobrar os carros ao mesmo tempo. Aí coloquei a caixinha”. Seus chefes, os maiores apoiadores de seu trabalho, cuidaram de arranjar a bicicleta que se transformou na loja itinerante.

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Renato se emociona quando conta tudo o que já passou para chegar até ali. Saiu pequeno de seu estado natal e passou por muita coisa, “como um bom Severino”, antes de conseguir um emprego fixo em São Paulo. Foi ao assistir a um vídeo sobre Geraldo Rufino, um ex-catador de lixo que se tornou empresário, que ele decidiu que faria alguma coisa diferente. Afinal, o começo daquela história parecia com a sua. “Ele comeu comida do lixo antes de empreender, até acertar. Eu pensei: se esse cara conseguiu, por que eu não posso?”.

Renato na verdade é Israel Joaquim de Santana. O ‘apelido’ se transformou em nome porque foi assim que se apresentou à sua mulher, Viviane, quando se conheceram uma década atrás. “Eu tinha muitas namoradas, então falava um nome para cada uma. Mas acabei casando e tive que contar a verdade. Aí pegou e todo mundo me conhece assim”, ri. Viviane o ajuda a confeccionar os vasos, num canto que faz as vias de ateliê na casa da família no Carandiru. Ele gosta que os quatro filhos o vejam trabalhar. “Eles veem o mundo pelas tragédias que passam na televisão, mas não é só isso”, conta. “Eu estou provando não só para eles, mas para todo mundo, que a honestidade existe, sim”. E dá para duvidar?

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