Os arranjos e laços estão cada vez mais diversos — e sendo reconhecidos pela justiça — mas alguns tabus persistem. ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏
Família é uma instituição social. Isso significa que ela muda no tempo e no espaço de acordo com as transformações econômicas e culturais e com a própria composição das populações. Hoje, ela tem cada vez menos a cara da família nuclear tradicional aos quais as alas mais conservadoras da sociedade tanto se apegam. A seguir, a gente faz um apanhado de como os modelos familiares foram se moldando ao longo das décadas e das muitas formas que a instituição tem hoje no Brasil.
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O modelo “pai e mãe casados com filhos” que, em 1995, correspondia a aproximadamente 58% das famílias brasileiras, passou para 42% na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2015. Ou seja, formatos diferentes da chamada “família tradicional” já são maioria: pais divorciados que constituíram novas famílias com filhos de ambos, casais homoafetivos com crianças adotadas, casais sem filhos, entre tantos outros.
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Esse movimento tem muito a ver com fatores como a emancipação das mulheres, principalmente a partir dos anos 1960, além da possibilidade da dissolução do casamento e, claro, a conquista de direitos da comunidade LGBTQIA+. E não só as configurações se alteraram, mas os papéis dentro das famílias: hoje as mulheres são as principais fontes de renda de 45% dos lares no Brasil. A diversidade de arranjos também têm questionado conceitos culturais hegemônicos como o da monogamia e o de quem deve ou não habitar o mesmo teto, como mostram casos como o desta carioca que mora junto com os dois companheiros, a irmã, o cunhado e três crianças.
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Antes, a família estava totalmente ligada a casamento formal e consanguinidade. Na última década, porém, é crescente a visão nos tribunais de que os laços de afeto são mais importantes. Foram se criando termos novos, como, por exemplo, “família anaparental”, usado para “pessoas que convivem em uma mesma estrutura visando a objetivos comuns”, como duas amigas idosas que decidem morar juntas. A paternidade e maternidade socioafetiva — geralmente em relações de “padrasto” e “madrasta” —, que há muito tempo está presente, só passou a ser regulada juridicamente em 2017, com possibilidade de reconhecimento oficial e adoção de sobrenome. A desburocratização do reconhecimento de paternidade, aliás, faz parte da luta de um grupo familiar muito relevante: o das mães solteiras, que representam 16,3% da população de acordo com o Pnad de 2015. Só nos sete primeiros meses deste ano, 100.717 crianças foram apresentadas em cartórios por mães solo. E muitas pessoas ainda encaram desafios diante da lei, como é o caso dos trisais, que precisam recorrer à justiça por pedidos de multiparentalidade para os filhos, já que a união entre três pessoas não é prevista na legislação brasileira.
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É fácil perceber que as velhas noções de família não ficaram pra trás. Como lembra a professora Instituto de Psicologia da USP, Belinda Mandelbaum, que coordena o Laboratório de Estudos da Família (LEFAM), neste vídeo: “Apesar de todas as transformações e da diversidade de arranjos familiares pelo mundo, ainda temos na sociedade e na nossa própria mentalidade a ideia de que existe um modelo ideal para a família.” Uma pesquisa realizada em 2018 com mais de 2 mil pais e mães mostrou que ainda é tabu conversar com as crianças sobre a diversidade na composição de lares e que 37% dos filhos de mães-solo já sofreram preconceito por sua configuração familiar não tradicional, assim como 29% das crianças em família homoafetiva, 26% das adotivas e 18% daquelas que têm pais separados. E, em tempos de insurgências de ondas conservadoras, a defesa da “família tradicional” tem sido usada como arma política – para entender mais, vale ouvir esse episódio do podcast da Folha de S.Paulo, em que a socióloga e pesquisadora da Unifesp Esther Solano explica como o bolsonarismo se apropriou da pauta da família diante de uma parcela da população e como é preciso olhá-la de outra maneira.
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• A história de Milton Nascimento e seu filho adotivo que o salvou da depressão.
• 5 livros infantis para falar de diversidade familiar.
• “Em Casa com os Gil” (2022) é uma espécie de reality show com a família de Gilberto Gil que mostra, além de muita cantoria, as relações dessa família de árvore genealógica não convencional.
• Na ficção, a série “Manhãs de Setembro”, que acabou de ganhar segunda temporada, traz a cantora Liniker como Cassandra, uma mulher trans, sua vida como cantora no centro de SP, e suas relações familiares com o filho e a mãe dele.
• A filósofa Marcela Tiboni, autora do livro Mama: Relato de Maternidade Homoafetiva, fala sobre o tema em seu perfil no Instagram e em entrevistas em podcasts como esse.
• O diário de uma adoção é uma linda reportagem da revista Piauí que conta o caminho de um casal gay para chegar até seu filho e dá um panorama ainda atual da adoção no Brasil.
• A educadora parental Mari Camardelli é criadora do movimento Somos Madrastas, que visa desmistificar visões negativas sobre esse papel. Veja a entrevista com ela no podcast Calcinha Larga.
• Um vídeo que fala sobre os problemas da família nuclear e uma reportagem sobre como muita gente tem se juntado para criar crianças em comunidade para tentar resolvê-los (em inglês).
• Um minidocumentário da revista britânica Economist revela o aumento da desigualdade social entre as famílias (em inglês).
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