Apesar de não ser divertido, em certos níveis, o tédio pode ter muito a nos ensinar. ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏
Seja uma criança que não aguenta mais o fim de semana sem graça, ou um adulto que olha fixamente pra tela do computador sem conseguir cumprir suas tarefas, todo mundo já experimentou certo nível de tédio. Professor da Universidade de York, John D. Eastwood define o sentimento como “o desejo de ter uma experiência satisfatória em uma circunstância inevitável”. E quanto mais você pensa no tédio, mais ele parece se intensificar. É quase um instinto humano fugir desse marasmo em excesso. Nesses momentos, é comum se sentir sem propósito. No entanto, os aspectos sociais também pesam nessa balança. Afinal, na cultura de extrema produtividade em que vivemos, pessoas sempre ocupadas, adeptas do famoso lema “trabalhe enquanto eles dormem”, são vistas como vencedoras, enquanto ócio e procrastinação são julgados como “pecados”. Mas nas últimas duas décadas, o tédio começou a ser estudado com mais afinco, e as pesquisas já mostram que, mesmo sendo incômodo, ele pode sim, ser parte importante do processo de ter uma vida mais solar. Tudo depende da nossa atitude em relação a ele.
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O filósofo e escritor Andreas Elpidorou, que há anos estuda o ócio criativo, defende o argumento de que o tédio é como um mecanismo que regula nossa motivação pra completar tarefas. “Sem o tédio, ficaríamos presos em situações frustrantes”, diz em uma matéria da BBC. Segundo Elpidorou, estar entediado pode ser um aviso de que não estamos fazendo o que queremos e dar um empurrão em direção aos nossos objetivos. Mas, pra fazer essa ciência funcionar, é preciso avaliar o que nos causa o tédio. Você pode estar entediado porque tem se dedicado a tarefas fáceis demais, ou muito difíceis. Também pode ser uma questão mais profunda, como sentir que seu trabalho não é tão significante, ou que falta um objetivo claro a ser cumprido. Seja qual for o motivo, pode ser uma oportunidade de ajustar e repensar as prioridades, metas e desejos.
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Liberada das demandas imediatas do cotidiano, a mente encontra espaço pra ser mais criativa. Não à toa, é comum ter um insight sobre como solucionar uma questão, ou uma ideia incrível de projeto, justamente quando não se está pensando ativamente sobre o assunto. Um estudo da Universidade da Pensilvânia constatou que participantes entediados tiveram melhor desempenho criativo que os mais relaxados ou entusiasmados. Já em um experimento conduzido por cientistas da Universidade de Lancashire Central, no Reino Unido, foi pedido a dois grupos de participantes que eles imaginassem uma série de usos pra um par de copos de plástico. A um deles, no entanto, foi dada antes a tarefa de copiar uma série de números de uma lista telefônica. Conclusão: as pessoas que ficaram absorvidas pela função entediante primeiro foram mais inventivas na hora de pensar em finalidades para os copos. E os pesquisadores comprovaram depois que, quanto mais enfadonha era a primeira tarefa, mais a criatividade aflorava na segunda.
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Por trazer um estado mental de menos stress e mais calma, o tédio pode nos ajudar a resolver problemas e conflitos com mais clareza. Além disso, já existem diversas pesquisas que comprovam que o não fazer NADA é muito importante pra ter uma boa produtividade. Um artigo da Psychology Today também afirma que pessoas entediadas buscam significado para suas vidas com mais frequência. Deste modo, engajam em atividades altruístas e de cunho social. Por fim, o tédio pode ser ainda mais importante para as crianças. Isso porque, além da criatividade, ele estimula a imaginação e faz com que os pequenos aprendam a gerir seu tempo. No entanto, em um mundo com tantos estímulos como celular, computador e videogame, é difícil sobrar alguns minutos pra deitar no sofá e reclamar que não tem nada pra fazer. Será que o resultado dessa realidade serão adultos cada vez menos criativos?
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Por mais que o tédio tenha de fato pontos positivos e que ele não precise ser necessariamente o oposto de prazer — como é definido no dicionário —, em doses mais intensas, ele pode ser sim nocivo pra saúde. “Se você tem muito a fazer, mas está sentindo falta de sentido e propósito, por exemplo, você pode estar sofrendo de tédio crônico”, diz a psicóloga Sandi Mann à BBC. Nesses casos, é importante conversar com alguém e buscar ajuda psicológica. Já no trabalho, o tédio em excesso pode desencadear a Síndrome de Boreout. Ainda que não seja considerada uma doença, esse quadro acontece quando, sem tarefas pra cumprir, alguém entra em um estado de apatia permanente, que em casos mais graves pode causar transtornos mentais como a depressão e a ansiedade, problemas alimentares e vícios. Em entrevista à plataforma VivaBem Uol, a psicóloga Patrícia Regina Bastos Neder, professora da Universidade Estadual do Pará, afirma que sinais que servem como um alerta pra essa condição são uma angústia contínua diante do tempo vago, falta de identificação com o trabalho e uma baixa de energia constante.
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Da próxima vez que o tédio bater à porta, pode ser interessante tentar conviver com ele por alguns minutos. Vale tentar investir seu tempo em atividades que realmente permitem divagar sem distrações. Fazer exercícios físicos como natação, cuidar das plantas, praticar meditação e caminhar são bons exemplos. Ah, ficar rolando o feed por horas não entra nessa lista, ok? Inclusive, pesquisa publicada no jornal científico The Royal Society descobriu que a tecnologia, apesar de ocupar nossa mente em um primeiro momento, não nos deixa menos entediados — e em alguns casos pode até aumentar esse sentimento.
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