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Redley nos anos 1980: da Califórnia ao Rio de Janeiro

Por
Adriana Setti
Em parceria com
true

Em meio a um cenário de abertura política, e ao som de Blitz, Paralamas do Sucesso e Kid Abelha, nasce o tênis que coloriu o Rio de Janeiro da Zona Sul à Zona Norte e que seria a pedra fundamental da Redley, a marca que fez a cabeça da juventude carioca de alma solar, adepta a um lifestyle de praia, surf e bodyboard.

Nos anos 1980, o Brasil vivia um momento de abertura política, após mais de duas décadas de ditadura militar. Com Blitz, Paralamas do Sucesso e Kid Abelha rolando no walkman, e na expectativa das maiores bandas do cenário internacional que se apresentariam no primeiro Rock in Rio, a juventude dessa época andava de mullets, curtia roupas fluorescentes e não perdia um episódio de Armação Ilimitada. Por outro lado, nesse mundo sem internet e pouco globalizado, o país continuava praticamente blindado aos produtos importados e as influências internacionais só chegavam, a conta-gotas, através do olhar dos poucos que viajavam ao exterior. Uma dessas pessoas que serviam de radar era Peter Simon. “Me considerava um intérprete do American way of life no Brasil, porque estava o tempo todo na Califórnia e acompanhava os movimentos que rolavam por lá”, diz o carioca, que estudou e passou várias temporadas nos Estados Unidos.

Glenda Kozlowski, Paulinho Esteves e Cris Zveiter: equipe de bodyboard

Antenado com as tendências de moda, ele costumava trazer alguns tênis gringos na mala e notou que certo modelo fazia sucesso entre os seus amigos. “Como já tínhamos uma fábrica de calçados, resolvi criar um produto melhor do que o californiano”, conta Peter. A operação envolveu a contratação de químicos nos Estados Unidos, compra das máquinas mais avançadas e diversas tentativas até chegar a um modelo de ótima qualidade. “Fizemos um investimento enorme, mas me orgulho de dizer que conseguimos.” Assim nasceram, em 1983, os Redley Originals. Made in Brazil, mas com alma californiana, eles foram inicialmente vendidos na rede de lojas do Cantão.

Nascimento explosivo

“Fundei o Cantão em 1965 com minha ex-mulher, a Leila, com foco na moda feminina. Mas, depois de uns anos, passei a querer construir uma marca masculina, carismática, diferenciada e com uma pegada americana”, conta Peter. Foi dirigindo pelas estradas da Califórnia, na companhia de Thomas, seu filho, que ele topou com o nome (quase) perfeito para sua nova empreitada. “A ideia era usar uma palavra com a sonoridade do inglês. Daí passamos por uma cidade chamada Reedley e pensei que se tirasse um ‘e’ seria mais fácil de pronunciar no Brasil. Registrei e pegou”, diz Peter. 

Em pouco tempo, o tênis se tornou uma febre. “Era um produto inédito, não só em termos de formato e look, mas que também tinha uma gama enorme de cores”, diz Clemente Borges, desenvolvedor de produtos e coordenador de estilo nos anos 1980 e 1990. Ao passo que o tênis coloria as calçadas do Rio de Janeiro, o Rio Sul, shopping mais conceituado da cidade na época, localizado em Botafogo, estava inaugurando um quarto piso. “Eles queriam que o Cantão fosse uma das âncoras desse novo espaço e foi aí que surgiu a ideia de que o tênis deixasse de ser um apêndice para virar uma experiência à parte”, lembra Thomas Simon, CEO da S2 Holding, grupo que administra a marca.

Inaugurada em 1985, com 40 metros quadrados, a primeira Redley era a réplica de uma cabana da Califórnia, com teto de sapê e playlist internacional selecionada a dedo, com reggae e rock australiano que dificilmente tocava nas rádios. Ao lado dos tênis, eram vendidos board shorts, mochilas e camisetas. “Depois que a gente foi para o Rio Sul, o negócio tomou corpo. Na época, a sociedade do Rio de Janeiro era extremamente segmentada e aproveitamos o momento para fazer uma associação da marca com o bodyboard e depois o surf, já que havia um espaço ali que quase ninguém estava ocupando”, diz Thomas. “A gente queria que o mesmo cara que pegava onda em Geribá no sábado estivesse vendendo pé-de-pato e tênis na Redley na quarta-feira, com os mesmos códigos de comportamento e a mesma maneira de se relacionar. Foi assim que construímos uma história autêntica e genuína, através desses jovens que tinham capacidade de influenciar.”


Bodyboard: a porta de entrada da marca nas praias cariocas

Life is a beach

Vitrine do lifestyle de praia no Brasil, o Rio de Janeiro viveu um boom do surf nos anos 1980. “Quando comecei a pegar onda no Recife, em Pernambuco, o esporte era muito conectado a antiprofissionalismo, vagabundagem e drogas. Mas, quando cheguei ao Rio de Janeiro, vi que o surf já tinha uma imagem muito melhor, de saúde e qualidade de vida. A Redley traz isso no seu DNA, porque desde sempre esteve na vanguarda, equipando essa tribo”, diz o big rider pernambucano Carlos Burle, que foi patrocinado pela marca entre 1994 e 2019. “Nessa época, poucas empresas faziam um trabalho com a galera do surf e a juventude saudável do Rio de Janeiro, que tinha uma visão ampla da vida. E a Redley estava sempre à frente, lançando produtos diferenciados e buscando referências em lugares como a Califórnia e o Havaí”, completa o empresário e surfista Rico de Souza, cuja escola de surf, pioneira no Brasil, foi patrocinada pela marca a partir dos anos 1980. Segundo Leonardo Ferreira, que trabalhou na Redley por 27 anos e chegou a ser diretor criativo, a empresa foi inovadora em diversos aspectos. “Era uma época psicodélica, fluorescente, e tínhamos um nível muito bacana de ousadia na proposta dos produtos. Nossos estilistas e designers estavam sempre viajando pra fora, pesquisando, participando de feiras, o que era uma prática pouco comum naqueles tempos”, conta. 

“O surf e o bodyboard eram modas extremamente fortes nos anos 1980 e a Redley soube muito bem como aproveitar isso. Fazer parte da equipe era chegar ao topo”, conta a bodyboarder Mariana Nogueira, primeira atleta patrocinada pela marca, que garantiu seu espaço no mar ao produzir o primeiro pé-de-pato brasileiro especial para o bodyboard. “Até então, usávamos aquelas nadadeiras de mergulho, e o da Redley foi o primeiro feito para essa modalidade, que acabou ficando muito atrelada à marca”, diz. “Foi uma revolução! Todo mundo usava e pudemos evoluir nas manobras. Eu conseguia cruzar melhor as pernas, o que deixou o meu 360 ainda mais bonito”, lembra Isabela, a primogênita das irmãs Nogueira, que estavam entre os destaques dos campeonatos Redley que rolaram em Búzios, Saquarema e Itacoatiara (Niterói) entre 1985 e 1990, ao lado de outros atletas da equipe, como Stephanie Petersen e Glenda Kozlowski. 

Um passo à frente 

“Além de ter uma imagem de vanguarda, com anúncios que falavam a linguagem da juventude, a Redley patrocinava um time muito forte de atletas, que reunia aquela molecada bonita do Rio de Janeiro”, diz Claudio Martins de Andrade, fundador da revista Fluir, principal publicação brasileira especializada em surf nos anos 1980 e 1990, que ao longo de vários anos cobriu os campeonatos organizados pela marca. Esses eventos funcionavam como uma vitrine não só para os pés-de-pato, mas para board shorts, camisetas e mochilas. “A Redley conseguiu se antecipar ao desejo dos jovens, com uma estratégia de moda atrelada à performance dos atletas. Ela tinha uma energia de estar na frente, de criar tendência, de ter sempre o olhar da vanguarda e, ao mesmo tempo, continuar ao lado do consumidor entregando peças funcionais”, diz Carlos Burle. 

No fim dos anos 1980, a Redley já estava nos principais shoppings do Rio de Janeiro e era objeto do desejo dos jovens cariocas que viviam na praia. “Trabalhar na Redley nessa época era mágico. A gente se divertia e tinha um status muito forte. Éramos quase celebridades”, conta Ana Paula Xavier, que entrou na empresa como vendedora no Norte Shopping em 1989 e, hoje em dia, é supervisora de campo do canal de multimarcas. No auge do sucesso, mais de 250 mil pares de tênis eram vendidos ao mês, entre lojas e atacado, batendo nos 300 mil no período do Natal. “As pessoas vinham só pra tirar foto com a gente, encaravam filas enormes e praticamente brigavam pelos adesivos, que a gerente guardava no cofre! Trabalhando no varejo, nunca vi uma história parecida com a que vivemos nos anos 1980 e 1990”, diz. Surfando no sucesso dos Redley Originals, outros produtos lançados no final da década fizeram história, como os sapatos Nauru e as sandálias Kenner. 

Venha conhecer a coleção Redley 35 anos e todos os produtos que marcaram época.


Redley 35 Anos: Sempre em Movimento

A marca que traduz o lifestyle do Rio de Janeiro está fazendo aniversário. Celebrando sua história, mas sempre olhando pra frente, a Redley criou este canal para contar como se reinventou de forma incansável desde 1985. Leia todos os posts aqui.
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