O BOOM DA PSICOLOGIA DE BOTECO

Os termos psicológicos e psiquiátricos saltaram do consultório à mesa de bar. Até que ponto isso é bom?

ilustrações: eduardo gayotto

Nos últimos anos, termos que costumavam ser ditos e ouvidos apenas em sessões de terapia têm se tornado cada vez mais comuns. De repente, tudo é “gatilho” e milhares de perfis leigos nas redes falam de TDAH ou transtorno bipolar nos mais variados (e surreais) contextos, lançando diagnósticos para as massas. De onde veio isso?

NA BOCA DO POVO

“Talvez a linguagem da saúde mental esteja crescendo porque a saúde mental real está em declínio”, explica uma matéria da New Yorker. À medida que mais pessoas passaram a procurar ajuda nos consultórios, especialmente durante o auge da pandemia, e mais terapeutas começaram a compartilhar conceitos psicológicos nas mídias sociais, uma parcela maior da sociedade foi introduzida a esses termos.

O lado positivo desse fenômeno é a normalização do debate sobre a saúde mental, que já foi visto como tabu ­— e, em certos contextos, ainda é. Além disso, à medida que o vocabulário psicológico se populariza, mais pessoas conseguem nomear suas experiências e dores com termos concretos, o que pode ser reconfortante.

SEM TABU

Por outro lado, todo cuidado é pouco pra evitar patologizar qualquer comportamento negativo. Um amigo egoísta não é necessariamente narcisista. Dá pra se sentir estressado sem sofrer traumas. Mentir não é sinônimo de fazer gaslighting. Uma pessoa pode ter mudanças bruscas de comportamento e não ser bipolar. Quem perde o foco com facilidade não ganha diagnóstico de TDAH automaticamente.

Ainda que a popularização dos termos e do debate possa trazer alívio a quem sofre com questões de saúde mental, o uso excessivo dessas palavras pode atenuar seu significado e minimizar a experiência de alguém que realmente vive com um transtorno bipolar ou sofreu gaslighting, por exemplo.

LIMITE TÊNUE

Esses termos podem facilmente ser transformados em “armas” pra agredir e estigmatizar pessoas. Também tendem a ser usados em contextos inadequados e ganhar incontáveis interpretações errôneas por parte de gente que não tem a formação apropriada.

LÍNGUA FERINA

Dizer ao seu parceiro que ele é “tóxico”, por exemplo, não costuma ser produtivo, já que limita o diálogo. Ou seja, é melhor explicar objetivamente por quais motivos você está rotulando essa pessoa como tal. É por ciúmes? São as críticas excessivas? A falta de confiança?

VOCÊ É TÓXICO!!!

Pra não errar a mão, vale procurar aprender o que certas palavras significam e utilizar uma linguagem mais específica quando elas não aplicarem com precisão, deixando o discurso da terapia pra pessoas que têm a formação apropriada. E, acima de tudo, aceitar que alguém pode causar dor a você sem patologizar as suas ações.