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A viagem musical transoceânica de Anaïs Sylla. Veja o novo clipe

Por
Laura Cesar
Em
5 abril, 2019

A cantora francesa demorou pra acreditar que sua paixão poderia virar profissão. Foi só aqui, no Brasil, que esse relacionamento com os palcos foi finalmente assumido

Anaïs Sylla canta lindamente com uma voz rascante, impactante, mas que traz leveza e doçura ao se combinar com os sons dos instrumentos de percussão e violão. Sua música é sexy, e digo isso não apenas por ter letras em francês – uma da línguas mais charmosas do mundo -, mas também porque ela é híbrida e tem sonoridade única. Um som diferente que é resultado da mistura dos elementos de suas pesquisas musicais e antropológicas pelo Haiti, berço do despertar das primeiras revoluções negras; França, o seu país natal; e pelas matrizes africanas do Brasil e Senegal. Afinal, Anaïs é historiadora, filha de franceses e neta de senegaleses, e trouxe todas as suas raízes e conhecimento na criação da sua identidade musical. “Sou o que minha alma carrega, dos Fulas do norte do Senegal aos Mediterrâneos do sul da França. Minha música talvez seja tudo isso”, conta.

A artista demorou pra acreditar que sua paixão poderia virar profissão. Um namoro com a música sempre existiu, desde pequena, quando herdou os discos que sua avó e sua mãe ouviam (como Sade, Oumou Sangaré e Ali Farka Touré), até mais velha, na época em que vivia em Paris e gravava alguns coros para músicos. Mas só foi aqui, no Brasil, que esse relacionamento foi finalmente assumido. Uma relação recente que se concretizou ao subir no palco pela primeira vez num pocket-show em Salvador, no início de 2018.

Apesar da estreia musical ter sido aqui, não foi pela música que Anaïs deixou seu país natal rumo à terras brasileiras. Ela veio pra cá pela primeira vez em 2013 com a intenção de mergulhar nos estudos sobre miscigenação e história da escravidão, na USP. Se apaixonou por São Paulo, viajou pelo país, conheceu comunidades quilombolas e algumas pessoas do ramo da música, como as meninas da Bahias e a Cozinha Mineira. Dois anos depois decidiu voltar com a desculpa de iniciar um doutorado e nunca mais deixou o Brasil. “Em São Paulo fui muito bem acolhida e consegui me reconhecer. Se fosse na Suíça ou Alemanha me sentiria muito mais estrangeira que aqui”.

E todo esse processo de mudança pro Brasil e de se aprofundar na história colonial por meio da pesquisa foi fundamental pra Anaïs se conectar com sua herança cultural e assumir quem era. Nessa época, lá em 2016, embarcou numa viagem transformadora com o avô pro Senegal, onde conheceu um pouco da sua ancestralidade. Saber de onde ela vinha foi essencial pra ir de encontro com a musicalidade adormecida dentro dela. Voltou ao Brasil com a inspiração necessária para compor de maneira que ficasse satisfeita e o resultado está nas quatro canções autorais do seu EP, lançado em setembro de 2018. Faixas que nasceram juntas dentro da solidão e da saudade.

Foto: Mel Coelho

Desde então Anaïs não parou mais. Teve a honra de dividir palco com músicos como Otto e Nelson Sargento em uma das inúmeras performances por São Paulo e Brasil. Gravou o primeiro clipe da linda música De “Bouche à Bouche”, gravado no litoral norte de São Paulo, que estreia hoje, 9 de abril, com exclusividade aqui no The Summer Hunter. A música mistura ritmos brasileiros com uma voz soul e um canto suave em francês e dialoga entre Bahia (Caetano Veloso, Gilberto Gil) e os Caribes franceses (Henri Salvador, Kassav). Dirigido por Alessandra Sorrentino e Thatiane Almeida, o clipe mergulha numa balada visual onírica. Anaïs invade a natureza para se recordar de sua essência profunda. “Ao final é de boca a boca que as historias correm, vagueiam e se repetem eternamente” , como sublinha a cantora para traduzir o titulo de sua musica.

Anaïs ainda estuda um projeto de gravação do segundo vídeo, que irá abordar a questão do feminicídio, e se prepara para produzir o primeiro disco com lançamento previsto pro segundo semestre. Tudo ainda é meio novo para Anaïs mas, aos 29 anos, é justamente esse brilho de quem tá começando que é encantador nela. Enquanto os próximos projetos não saem do papel, a artista se arrisca na composição em português e segue cantando. Pra brincar, se encontrar, resistir.

Anaïs Sylla
Foto: José de Holanda
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